Para que seja possível compreender quão
fundamental é o período gestacional, bem como os primeiros anos após o
nascimento, faz-se necessário conhecer um pouco sobre o desenvolvimento do
nosso cérebro quádruplo. São eles: Cérebro Reptiliano ou Sistema
Sensório-Motor, Cérebro Emocional ou Sistema Límbico, Cérebro Racional ou
Neocórtex e o nosso cérebro “mais recente”: Córtex Pré-Frontal.
A natureza constrói cada novo cérebro
na tentativa de corrigir possíveis erros dos antigos sistemas ou a fim de
ampliar a capacidade dos mesmos. Segundo Chilton Pearce, autor americano de
diversos livros sobre Educação, a impressionante diferença que existe entre as
estruturas neurais do nosso cérebro, faz com que essa herança seja ao mesmo
tempo uma bênção e uma maldição. Quando integrados, esses sistemas nos oferecem
um potencial ilimitado, uma habilidade de ascensão e capacidade para irmos além
de todas as restrições ou limites. Ação, sentimento e pensamento integrados.
Mas quando essa integração falha, a nossa mente é como uma casa dividida em
partes que se colocam contra elas mesmas, o nosso comportamento, uma guerra
civil paradoxal e nos tornamos nosso pior inimigo.
Na ordem de desenvolvimento, temos:
o Cérebro Reptiliano, que promove apenas reflexos simples e se
encarrega da sobrevivência e da aprendizagem física de algumas habilidades.
O Cérebro Emocional, que exerce o controle dos nossos
comportamentos. E é onde se encontra a base para todas as nossas formas de
relacionamento. A terceira estrutura diz respeito ao Cérebro Racional,
o qual processa a linguagem e o pensamento, e nos traz possibilidades
completamente diferenciadas dos demais animais. E por fim, nossa última e mais recente
conquista: o Cérebro Pré-Frontal. O neurocientista Paul MacLean
considerava os pré-frontais o quarto sistema evolucionário, e os chamava de
“lobos angélicos”, atribuindo a eles nossas grandes virtudes humanas de amor,
compaixão, empatia e compreensão, assim como as nossas avançadas habilidades
intelectuais.
É interessante observar que cada um dos
nossos cérebros começa a se desenvolver no útero na mesma ordem hierárquica de
seu aparecimento na natureza. No primeiro trimestre da gestação surge o cérebro
reptiliano, no segundo trimestre o cérebro emocional e no terceiro e último
trimestre, o cérebro racional passa a se desenvolver. A mais nova adição da
natureza, o cérebro pré-frontal, dá seus primeiros sinais somente após o
nascimento, mais precisamente, durante o primeiro ano de vida.
Um ser bem gestado e bem cuidado,
principalmente até seus três primeiros anos de vida, tem privilégios
extremamente significativos em relação àqueles que não receberam tais
benefícios. Isso acontece pelo simples fato de que nossas futuras atitudes vão
depender muito das experiências vivenciadas nesse período. Estes anos são um
marco no nosso tempo de vida, pois é quando o nosso sistema emocional
desenvolve as raízes para acolher nosso intelecto superior ainda por vir. Ainda
por vir! É importante frisar essa informação, pois poucos sabem que
nossas emoções nos governam muito antes de aprendermos a nomeá-las. O cérebro
emocional nasce antes do racional, o que significa que primeiro sentimos, para
somente depois compreendermos (ou não) esse sentimento e associá-lo a uma
situação. Primeiro amamos ou nos sentimos rejeitados, para só posteriormente
procurarmos entender o motivo. É por isso que, principalmente no caso da
rejeição, é tão difícil dar-se conta de que houve uma indiferença por parte do
cuidador. Geralmente o indivíduo em questão busca racionalizar ao máximo os
porquês do seu sentimento de inferioridade ou inadequação. Ele nega a falta de
amor que já foi sentida, sob os inúmeros véus do intelecto. Nascer e ser cuidado
por uma mãe carinhosa é o maior mérito que alguém pode receber. Não se
aprende a amar... O amor é que ensina.
“A intencionalidade precede a
capacidade de fazer” Jerome Bruner
É curioso notar que o cérebro mais
elaborado necessita do perfeito andamento daquele que o antecede, para que ele
possa expressar todo o seu potencial. Ou seja, o cérebro racional só pode se
desenvolver plenamente após o funcionamento total do cérebro emocional, o qual,
por conseguinte, só apresentará harmoniosamente suas habilidades, depois que o
cérebro reptiliano estiver em adequada atividade. Qualquer falha prematura no
desenvolvimento do nosso cérebro emocional, por exemplo, prejudicará tenazmente
o funcionamento do cérebro racional.
O papel da mãe
Pode-se afirmar, portanto, que o
cérebro emocional da criança não está pronto para atuar até que seu cérebro
reptiliano esteja em total andamento. Por isso, a mãe é precisamente programada
para agir como o cérebro emocional de seu filho. Ela (ou seu substituto),
servirá de modelo para que um relacionamento adequado seja estabelecido,
suprindo as necessidades básicas que o bebê apresenta em seu primeiro ano de
vida, tais como alimentação, proteção entre outras. Quando as funções do
cérebro reptiliano estiverem em plena ordem, a criança buscará na mãe o modelo
do qual necessita para agir emocionalmente. E da mesma forma, quando o cérebro
emocional do bebê estiver em plena operação, a mãe fará o papel do cérebro
racional substituto e servirá de modelo para o desenvolvimento de seu intelecto. Maria Montessori já dizia que uma humanidade abandonada no seu primeiro estágio de formação, torna-se a sua própria grande ameaça para sobreviver.
Um dado digno de nota diz respeito aos
autistas. Sessenta a setenta por cento dos autistas apresentam deficiência do
lado esquerdo do cérebro (cérebro racional). O que ocorre, bem provavelmente,
devido a um vínculo empobrecido entre o bebê e sua mãe durante a fase de
desenvolvimento do cérebro emocional, tanto no útero, quanto fora dele. Estudos
recentes mostram que filhos indesejados têm maior chance de nascer
esquizofrênicos ou autistas.
O olhar da mãe cura
Entretanto, partindo do princípio que o
modelo foi satisfatório e bem sucedido, a criança torna-se capaz de agir com um
grau de independência cada vez maior. Se a mãe proporciona todos esses
atributos em um estado emocional positivo, o desenvolvimento é tranquilo e
livre de traumas. É a conduta da mãe que vai determinar o estado emocional da
criança bem como todo o seu processo evolutivo de uma maneira geral. Se
aprendermos matemática sob a ameaça de uma bronca ou qualquer humilhação, o
medo e a vergonha tornam-se parte desse aprendizado tanto quanto os números em
si. Chilton Pearce assinala que ao exercitarmos o que foi aprendido, mesmo anos
mais tarde, os mesmos hormônios emocionais irão desempenhar os seus papéis
porque eles também são elementos do padrão neural, assim como o objeto da
aprendizagem- e o nosso corpo, cérebro e coração reagirão de acordo.
Vale relembrar que nosso último cérebro
a se desenvolver, é o Pré-Frontal. Ele não só é o último, como também o único
que inicia sua formação apenas fora do útero. E é justamente este o responsável
pela expressão das nossas características mais nobres, como amor e compaixão.
Parece que a natureza quis dar uma segunda chance ao conceder a gloriosa missão
de transmitir valores desse nível, novamente à mãe ou a um possível substituto.
Muitos dizem que não é a gravidez que transforma uma mulher, mas sim dar à luz.
O que sugere que uma mãe “ausente” na gravidez (acreditem, esse paradoxo
existe!), pode vir a ser uma mãe mais presente após o parto. Ou ainda, pode
ceder seu lugar a alguém que não prejudique ainda mais o cuidado que ela não
foi capaz de ter. É então somente a partir do nascimento, e através das experiências que desfrutará junto a este
modelo, que a criança irá construir suas habilidades no que diz respeito às
mais elevadas virtudes. Contudo, se o ambiente desse ser em formação não oferecer as condições suficientes para ativar os neurônios pré-frontais, os mesmos não se desenvolverão conforme designado.
Durante o período de um a três anos de vida, áreas específicas do cérebro delineiam seu repertório de experiências negativas e por volta da idade de três anos esses depósitos se mielinizam e seu funcionamento se torna permanente. Por toda a vida os acontecimentos vividos serão, inconscientemente, comparados com aqueles que foram armazenados. Daí a importância de preencher esses anos com experiências gratificantes. Caso contrário seu parâmetro será na maioria das vezes ruim, o que faz com que esse indivíduo acabe se identificando frequentemente com o lado negativo das situações.
Durante o período de um a três anos de vida, áreas específicas do cérebro delineiam seu repertório de experiências negativas e por volta da idade de três anos esses depósitos se mielinizam e seu funcionamento se torna permanente. Por toda a vida os acontecimentos vividos serão, inconscientemente, comparados com aqueles que foram armazenados. Daí a importância de preencher esses anos com experiências gratificantes. Caso contrário seu parâmetro será na maioria das vezes ruim, o que faz com que esse indivíduo acabe se identificando frequentemente com o lado negativo das situações.
Tudo o que o uma criança precisa é ser
acolhida e amada. Porém, apesar de ser o mínimo, é cada vez mais escasso nos
dias de hoje. A preocupação com o sexo da criança, para citar apenas um entre
os vários exemplos, torna-se muitas vezes maior do que com outros aspectos
muito mais relevantes para o bem estar da mãe e do bebê. Exames extremamente
precoces, são além de invasivos, prejudiciais ao feto. Entretanto são
“vendidos” para matar a curiosidade da mãe e para que esta possa ter tempo de
percorrer longas distâncias a fim de comprar o enxoval do bebê. Mães que vão
tão longe, mas se esquecem de que nunca mais estarão tão perto de oferecer o
único bem que seus filhos realmente precisam: amor. Há algum tempo se fala da
importância de conversar com seu filho desde que se tome conhecimento da sua
existência. Mas ainda existem gestantes que passam nove meses ignorando o fato
de que carregam um ser dotado de sentimentos e percepções. O maestro canadense
Boris Brott aprendia trechos de algumas obras com extrema facilidade e se
questionava a respeito. Ao comentar isso com sua mãe, que era violoncelista,
ela lhe contou que aqueles eram justamente os trechos que ela tocava durante a
gravidez e que deixou de executar após esse período.
Além das diversas condutas citadas ao
longo do texto serem simples, são acessíveis ao mundo inteiro. Não depende de
credo, raça, nível social nem intelectual. Basta conscientizar-se de que poucos
anos de carinho e atenção podem ser suficientes para preservar uma nova vida de
inúmeros prejuízos.
"Os homens são o que as mães fazem
deles." Ralph Emerson (1803-1882)
Nunca pude imaginar que uma parte do cerebro se formava pelo contato entre mãe e filho. Estou impressionada. Gratidão pela valiosíssima informação.
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